» TAREFA DE CASA

 INSPIRAÇÃO CONSULTORIA PEDAGÓGICA

                            

Qual a importância da tarefa de casa?

(Maria Luzita de Faria – Pedagoga – Inspiração Consultoria Pedagógica / ao copiar cite a fonte)

“Pensar é o trabalho mais difícil que existe.

 Talvez por isso tão poucos se dediquem a ele.

Henry Fordâ€

 

Minha rotina é cansativa, acordo às 6h, tomo banho e acordo as crianças para tomarmos café e irmos para o trabalho e para a escola, respectivamente. A partir deste momento trabalho às vezes até às 20h, num dia normal até às 18h30. Chegamos à casa, quase sempre 19h30 ou 20h. Claro que primeiro dou janta as crianças e depois nos sentamos na sala para ver as agendas. Já é quase 21h quando me deparo com: – fazer trabalho sobre o tema tal, ou estudar para a prova x, ou fazer texto no caderno e completar as folhas xx até yy do livro de Português, Matemática, História, ou seja, o que for.  Na maioria das vezes tentamos fazer todas as tarefas, principalmente aquelas com recorte ou pesquisa na Internet. Estudamos, mas quem apreende alguma coisa passada das 22h?

As crianças tomam banho, já irritadas, pois não brincaram e nem viram TV, só tarefas e mais tarefas. Quando vou tomar meu banho já são meia noite!

Ainda no banho começo a pensar, meu Deus, quem disse que tarefa de casa serve para alguma coisa não viveu em nosso século! Como pesquisadora e professora vou atrás de informação.

Ora, a tarefa de casa foi criada para resolver um problema bem pontual. Nos idos de 1920 as crianças norte americanas (isso mesmo! Sempre eles) da área rural não conseguiam ir à escola todos os dias, então a escola para suprir esta deficiência enviava as tarefas da escola para serem feitas em casa com o auxílio dos pais. Resolvido.

Então como foi parar tanta tarefa de casa lá em casa?

Simples, tal prática foi se cristalizando nos modelos americanos e acabou sendo absorvida pela grande maioria das escolas. Como nosso modelo escolar vem principalmente das escolas americanas acabamos incorporando a tarefa e o discurso pró tarefa. Mas será que isso é mesmo necessário nos dias de hoje? Quanto tempo o aluno deve se dedicar aos estudos fora da sala de aula? É mesmo fundamental haver lição de casa todos os dias? Como os pais devem ajudar nas tarefas? O que fazer quando o estudante tem dificuldade para fazer os exercícios propostos pelos professores?

Existem três tipos diferentes de lição:

  1. Aquela que sistematiza conhecimentos é o tipo de lição mais comum. Nessa modalidade, o aluno faz exercícios, sozinho. Analisando as respostas, o professor verifica quais são os principais problemas individuais e coletivos da turma e pode reforçar os conteúdos em que os alunos apresentam mais dificuldades.
  2. A lição preparatória para a aprendizagem é a lição que introduz um novo tema. Antes de começar a trabalhar um novo tema, o professor pode pedir, por exemplo, que os alunos leiam notícias de jornais relacionadas ao assunto. Assim, antes de introduzir o novo conteúdo, ele sonda o que os estudantes já sabem sobre ele.
  3. Lição de aprofundamento é a lição em que o aluno aprofunda os temas já estudados por meio de trabalhos mais longos. Pode ser uma pesquisa sobre determinado assunto ou a apresentação oral de um trabalho.

No final da tarde quando pego as crianças na escola, pergunto: a professora corrigiu as tarefas? A resposta é: não ou foi feita autocorreção. Penso, então pra que tanta tarefa se os conteúdos não foram revistos pela professora ou verificados se precisava de recuperação?

A alegação da escola é que a rotina é importante para que a criança e o adolescente se organizem. Como a criança ainda não é capaz de estabelecer uma rotina sozinha – ela não tem autonomia para organizar o seu dia e os seus compromissos, lidar com horários, distribuir o tempo para brincar, fazer a lição, tomar banho, se alimentar – ela precisa da ajuda dos pais nesse processo. Os pais podem organizar um horário com a criança e ter controle sobre o seu cumprimento. Depois desta resposta, penso: eles não vivem lá em casa, onde cada minuto é cheio de tarefas de casa ou da escola. As crianças não tem tempo para serem crianças, até quando vou ter que lidar com esta situação?

Segundo Luciana Fevorini, do Colégio Equipe-S.P. “a lição de casa é uma atividade complementar, de apoio, não pode tomar uma tarde inteira, se a escola estiver exagerando na lição de casa, talvez seja o caso de os pais conversarem com os professores sobre a questão. Crianças e adolescentes precisam ter tempo para atividades extracurriculares, para praticar esportes, para brincar e até para não fazer nada. O ócio faz parte do desenvolvimento saudável dos jovens.â€

Peço reunião na escola e escuto o mesmo discurso, tem que fazer, serve para reforçar, blá, blá, blá. Em minha opinião desta forma não está ajudando, só faz com que a criança fique com ojeriza de tarefa de casa. Acredito que os professores adoram levar serviço para casa, devem sair da escola saltitando com cadernos, livros e provas para corrigir, devem adorar fazer planejamento em casa. Por isso vão fazer greve para pedir o fim das aulas especiais, porque querem mesmo é levar tarefa para fazer em casa.

Nova reunião e novo discurso, a lição serve para os pais acompanharem os conteúdos que estão sendo repassados na escola. Ora, para isso é só olhar os cadernos e rever os conteúdos, não preciso acabar com a noite, já prejudicada, das crianças. No final de semana só piora, vem dois ou três trabalhos, recortes colagens, maquetes e claro mais livro e cadernos.

E vem o discurso da organização dos horários, meu Deus o que essa gente tem contra o ócio? Será que as crianças não podem chegar a casa e brincar? Afinal passaram o dia todo na escola aprendendo e aprendendo…

Anote!
Estudos comprovam que crianças incentivadas pelos pais a estudar e a fazer as lições de casa têm um desempenho escolar melhor. No entanto, os pais devem ser alertados que estimular não significa executar a tarefa da criança.
 

Na escola tradicional, embora a lição de casa seja um recurso importante para a fixação dos conhecimentos ministrados em sala de aula, ela também tem como objetivo fazer com que o aluno exercite a própria responsabilidade e autonomia.

 

A tarefa de casa quando bem administrada auxilia o estudante a guardar o ensinamento que foi passado em sala de aula, aumentando o entendimento do tema. Este também é o momento de se aproximar mais dos pais, gerando uma interação entre a família. Através da lição de casa os pais ficam informados sobre o conteúdo que está sendo ministrado para o filho na escola, como está o seu desempenho em sala de aula e em quais disciplinas ele tem mais dificuldade.
A tarefa de casa serve para completar o trabalho feito pelo professor em sala de aula. Ao corrigir o dever de casa, o professor saberá quais são os obstáculos do aluno e tentará solucioná-los.
O estudante deve ter um local próprio para o estudo em casa. O ideal é que ele faça a tarefa em uma mesa, num ambiente arejado e que tenha um espaço para guardar os livros e cadernos. Por se tratar de uma atividade complementar, a lição de casa não deve ocupar todo um período. É importante acompanhar a correção da lição de casa feita pelo professor, perguntar se ele entendeu o erro e elogiar os acertos. Não é apenas o aluno que deve cumprir com a sua parte, os pais também devem participar. Vale ressaltar que a lição de casa é um exercício que o aluno deve fazer sozinho, para que o professor descubra quais são suas dificuldades.

Depende muito qual a linha pedagógica que a escola adotou, em cada linha a tarefa de casa é vista de uma forma. São elas:

Tradicional – O centro do trabalho pedagógico são os conteúdos acadêmicos, passados para os alunos, quase sempre, em aulas expositivas, com ênfase na repetição e memorização através de exercícios de fixação. O estudante é avaliado por meio de provas, que checam se a matéria foi bem apreendida. Adota regras de disciplina rígidas, com sanções para quem as desobedecer. Tarefa de casa todo dia, muita tarefa.

Construtivismo – Inspirado nas idéias do suíço Jean Piaget (1896-1980), é uma das linhas da chamada pedagogia ativa. Parte do princípio de que o sujeito constrói e organiza o seu próprio conhecimento. Ou seja, o aprendizado se dá através da interação da criança com o meio e com as pessoas. O professor é um facilitador. Deve oferecer atividades e oportunidades para que o aluno se desenvolva em suas dimensões cognitivas, afetiva, ética, estética e social. Também pode usar aulas expositivas. O mais comum, porém, é oferecer aos estudantes uma gama de estímulos, como atividades fora da sala de aula, filmes, idas a museus, estudos do meio, etc. A avaliação leva em conta o desempenho do aluno em todas as tarefas propostas, e não apenas nas provas. Normalmente as normas da escola são mais flexíveis, podem ser negociadas e até mudadas se for o caso. Tarefa de casa só quando é para participar de uma feira, é dado um tema e a criança desenvolve em casa com os pais.

Montessoriana – Idealizada pela educadora italiana Maria Montessori (1870-1952), também parte do princípio de que a criança é o sujeito na busca pelo conhecimento. O professor deve agir como um guia, incentivando o senso de responsabilidade do aluno pelos estudos, identificando suas dificuldades e o ajudando a superá-las. Maria criou grupos de materiais didáticos para trabalhar cinco áreas: vida cotidiana, estimulação sensorial, linguagem, matemática e ciências. São coisas como alfabeto móvel e objetos de encaixe, que ajudam a criança a desenvolver a concentração, o raciocínio e a criatividade. Ela tem liberdade de escolher as tarefas que deseja fazer. Geralmente as atividades são feitas em grupo, o que estimula a cooperação. Sem tarefas para casa, a proposta é para realizar em grupos na escola. Pode até solicitar um resumo de uma visita, por exemplo, mas é raro.

Waldorf – A proposta pedagógica criada pelo austríaco Rudolf Steiner (1861-1925) baseia-se numa concepção holística. Toda a programação em sala de aula procura desenvolver os aspectos físico, psicoemocional e espiritual do aluno. Nos primeiros anos de estudo, a criança tem uma forte estimulação motora, marcada por muitos trabalhos manuais. Uma das características da pedagogia Waldorf é não exigir muito cedo de o aluno o pensar abstrato. Por isso, cadernos e lápis são adotados apenas a partir do primeiro ano do ensino fundamental. Antes disso, não há empenho em que ele aprenda a ler e escrever. Um professor costuma acompanhar por vários anos a mesma turma e os pais são convidados a participar ativamente das atividades pedagógicas. As tarefas são desenvolvidas na escola junto com os pais, a escola e a comunidade andam sempre juntas, nada é feito sozinho ou em casa.

Tendência democrática- As escolas democráticas são baseadas na Escola Summer Hill, nascida na Inglaterra. São uma crítica à educação tradicional, que seria baseada no medo e no controle baseado em ameaças veladas, presenças obrigatórias e outras imposições. Seu grande diferencial é que seus alunos não são “obrigados” a assistir as aulas obedecendo a um cronograma comum, único. Eles escolhem as atividades a fazer de acordo com seus interesses. Para avaliar os alunos, procura-se abolir também lições de casa e provas; a avaliação é feita por sua participação e por trabalhos que podem ser escritos, artísticos etc.

Interacionismo é a interação entre o indivíduo e a cultura, onde, para Vygotsky, é fundamental que o indivíduo se insira em determinado meio cultural para que aconteçam mudanças no seu desenvolvimento. O conhecimento real da pessoa é ponto de partida para o conhecimento potencial, considerando-se o contexto sócio-cultural. Lev Vygotsky, tendo como base a teoria Marxista, procurava reformular a psicologia por meio de uma abordagem que permitisse entender as relações entre os indivíduos, as suas funções psicológicas superiores e o seu contexto social. Os seus achados revolucionários propõem uma situação de ensino/aprendizagem em que o indivíduo aprende por meio de sua inserção na sociedade, da sua interação com outros indivíduos; o contexto social é o lugar onde se dá a construção do conhecimento mediado. Não tem tarefa de casa a interação se dá na escola/comunidade/escola.

                Segunda a Secretaria Estadual de Educação do Paraná, cada escola tem autonomia quanto a ter ou não a tarefa de casa, mas indicam que se a escola é “em tempo integral a tarefa de casa é desnecessáriaâ€.

Ainda, que o regimento escolar, onde cada escola tem o seu, previamente aprovado pela SEED e dispõe dos deveres e direitos do aluno versa sobre as atividades extras que lhe serão incumbidas, bem como as tarefas de casa e os trabalhos escolares que necessitam de pesquisa.

Segundo Fernanda Boroski Krueger,Chefe de Gabinete,Secretaria Municipal da Educação de Curitiba: “não há nenhum decreto ou portaria regulamentando tarefas de casa na RME. Enquanto mantenedora, do ponto de vista pedagógico, também não há orientações formais sobre isso, ficando a critério das escolas essa organização/definição.â€

Ainda cansada das tarefas de casa fui até o site da escola ver de perto como a escola se declara e descobri que se declaram interacionistas, no seu regimento fala de tarefas e trabalhos que serão cobradas dentro de prazos previamente estabelecidos. Que raio de interação eles estão fazendo? Fico eu interagindo com uma criança cansada, fazendo uma tarefa ridícula que a professora não se dá o trabalho nem de corrigir? Acho que nossas escolas deveriam avisar os professores qual é a linha que foi escolhida pela escola e agir dentro dela. As escolas de uma forma geral têm um discurso no papel bem legal, somos dessa linha ou dessa, mas realmente são todas da linha tradicional enfeitando um ou outro ponto, uma feira aqui, uma visita lá. Vamos falar a verdade, tirando pouquíssimas escolas que investem no profissional e que ele sabe o que está fazendo a grande maioria dos nossos profissionais está com uma prática tradicional achando que faz parte de uma escola progressista.

Acredito na tarefa de casa, como auxiliar na formação do comportamento da criança, formação de bons hábitos. Não acredito nas tarefas como são repassadas nos dias de hoje, me parecem apenas perda de tempo!

“Alguns homens vêem as coisas como são,

 e dizem ‘Por quê?’

 Eu sonho com as coisas que nunca foram e digo

 ‘Por que não?’â€

George Bernard Shaw

 

 

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:

 

NOGUEIRA, MARTHA GUA  ,Tarefa de Casa – Uma Violência Consentida, Loyola Edições

 

Isa Maria Ferreira da Rosa Guará (org.)Escola, Família e Comunidade – Caderno Cenpec Nº 6, Livraria Cortez,

 

Philippe Meirieu ,Os Trabalhos de Casa, Ed. Presença, Publicado em NOVA ESCOLA Edição 243, JUNHO/JULHO 2011. Título original: A hora de estudar sozinho e ver o que aprendeu

 

 

Revista Percursos produzida pelo  Laboratório de Estudos sobre

Mudanças na Escola ano 1 | número 1 | fevereiro/2005

www.linhamestra.com/percursos

consulta 11/04/2014